Músicas hipersexualizadas: Perigo para crianças – Psicóloga esclarece

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“Duas meninas caminhando de mãos dadas, representando a inocência da infância, em contraste com o impacto negativo que músicas com letras sexualizadas podem ter sobre crianças.”

Cada vez mais, músicas com cariz erótico fazem parte dos ambientes infantis. Seja em festas municipais, nas escolas de dança ou até mesmo em contexto escolar, as músicas hipersexualizadas fazem parte do ambiente das crianças.

Mas este fenómeno deve ser travado com urgência, alerta a psicóloga Doutora Beatriz Pereira.

A Doutora indica ainda, que este tema merece a atenção devida, afinal, enquanto sociedade, devemos proteger a integridade dos mais pequenos. Isto porque a “exposição das crianças a este tipo de música tem um impacto negativo no desenvolvimento infantil”.

Respondendo às nossas questões, a psicóloga nos elucida sobre as repercussões futuras que as nossas crianças podem acarretar se não agirmos de forma consciente agora:

 

1. Como sei que uma música é imprópria para crianças?

Eu diria que através do bom senso é fácil identificarmos o que é uma música imprópria para crianças. 

Se pensarmos que o papel de uma criança é brincar e aprender e que, durante a infância, a criança está a explorar e absorver tudo à sua volta para criar o seu imaginário, então basta refletir sobre que imaginário queremos que seja formado

O que queremos que a criança aprenda? 

Que valores queremos transmitir à criança? 

O que queremos preservar na criança? 

A segurança, a inocência… 

Então, tudo que vá contra estas respostas, é impróprio fazer parte da letra de uma música que seja ouvida por crianças: 

  • Incentivo ao uso de drogas, 
  • Uso de palavrões, 
  • Incentivo ao ódio, 
  • Conteúdo sexual… 

Mesmo que através de expressões “disfarçadas” como “senta no pai, vai no cavalinho…”. 

Porque já sabemos que agregado a estas músicas vem outras coisas relacionadas com um estilo de vida que é promovido e que as crianças vão querer imitar: as expressões, as danças, as roupas… 

 

2. Existe algum impacto no desenvolvimento infantil quando a criança é exposta a músicas hipersexualizadas?

Com toda a certeza. Na verdade, quando expomos uma criança a músicas com conteúdo hipersexualizado, podemos estar a contribuir para que esta criança salte etapas do seu desenvolvimento

Por exemplo, a criança pode:

  • Ter um interesse prematuro pela exploração da sexualidade quando ainda não tem maturidade cognitiva e emocional para compreender estas questões; como consequência pode perder o interesse por atividades e “coisas” típicas da sua idade, como a substituição da brincadeira por dancinhas sensuais, ou a substituição do interesse em roupas de desenhos animados por roupas que exponham o corpo; 
  • Desenvolver uma imagem corporal distorcida pelos padrões de imagem que são promovidos neste tipo de músicas, o que vai afetar a auto-estima da criança; 
  • Pode normalizar comportamentos mencionados nestas músicas e até replicar em contextos que não são adequados, como na escola; e como consequência afetar a relações interpessoais que esta criança vai ter no futuro: a forma como vê o conceito de namoro, por exemplo. 

 

3. O que pode acontecer à criança, futuramente, se consumir este tipo de músicas com certa frequência durante a infância?

Tudo aquilo que vem como consequência do que mencionei anteriormente. 

Termos adolescentes e adultos com:

  • Uma imagem corporal distorcida e baixa auto-estima, 
  • Um maior foco na aparência do que noutras qualidades a serem desenvolvidas, 
  • Comportamentos sexuais de risco e premiscuidade, 
  • Dificuldade em manter relações interpessoais e íntimas saudáveis, 
  • Maior vulnerabilidade para desenvolver perturbações de ansiedade e depressão derivadas de todos os fatores que já foram abordados. 

Na verdade, nem têm de ser consequências para um futuro longínquo, podemos ver consequências na própria infância: sabemos que por normalizarem os comportamentos que são promovidos por este tipo de música, as crianças estão mais expostas a situações de abuso, por exemplo. 

4. Se o meu filho ouvir músicas com conteúdo erótico só durante um evento, pode impactar o seu desenvolvimento?

À partida o impacto será menor do que ouvir repetidamente, mas ainda assim pode ter impacto. Vai depender de todo o contexto envolvente da criança. 

Vamos imaginar que a criança fica com curiosidade: Tem acesso livre ao telemóvel/tablet para ir pesquisar as músicas novamente? Se questionar os pais, como é que estes vão responder? Poderá a criança ir partilhar com colegas da escola e gerar-se aí novas oportunidades de ouvir as mesmas músicas? 

Depois claro, temos aqui a questão do evento em si ter gerado desconforto à criança porque ela própria percebeu que algo de inadequado estava a acontecer. Aqui vai ser igualmente importante a postura dos pais ou adultos que estiveram com a criança no evento. 

 

5. O problema está na letra da música ou existem outros aspectos que fazem da música imprópria para crianças?

O problema está na letra da música e em tudo o que vem associado a essa letra: os gestos, as danças, as poses, as roupas…

 

6. Se a criança ainda não compreende o significado das letras, pode ouvir e dançar músicas hipersexualizadas sem repercussões negativas para o seu desenvolvimento?

Primeiro, existe aqui uma questão importante: como é que definimos o limite que separa o momento em que a criança passa de não compreender o significado das letras para a compreensão das mesmas? 

Vamos imaginar que temos uma criança de 1 ano a ouvir este tipo de música e que vemos claramente que ela não compreende o seu conteúdo: Esta criança vai fazer 2 anos, 3 anos e vai atingir o momento em que começa a compreender qualquer coisa.

O que fazemos então? Retiramos o acesso a estas músicas nesse momento? Depois da criança já estar super familiarizada com as músicas, já saber cantar, dançar, e pedir repetidamente para as colocar? 

Depois, temos ainda outra questão importante: conseguimos controlar inteiramente quem está a assistir os nossos filhos a dançarem esse tipo de músicas? 

Vamos imaginar que estamos num espetáculo de uma academia de dança, em que crianças de 6 anos estão num palco, num local público, a “abanar a raba” como essas músicas dizem: controlamos que tipo de pessoas estão a observar os nossos filhos? De que forma os estamos a expor? 

E depois claro, continuamos a ter os impactos no desenvolvimento de que já falei, mesmo sem a compreensão da criança, por questões de imitação: a criança vai pedir para dançar essas músicas em vez de brincar, vai pedir camisolas com barriga à mostra e calções curtos em vez de roupa de criança, e isso tudo vai ter um impacto a longo prazo no seu desenvolvimento.  

 

7. Qual é a medida que devo tomar se estiver numa festa com este tipo de músicas?

Falar com o anfitrião e pedir para trocar as músicas, ou no limite ausentar da festa. E estar atento à curiosidade que as músicas despertaram nas crianças para se poder conversar sobre o assunto caso seja necessário. 

 

8. O meu filho gosta deste tipo de músicas, o que devo fazer?

É importante não fazer de conta ou tornar o assunto tabu! 

Portanto, diria que as soluções passam por conversar abertamente sobre o assunto, explicando porque é que essas músicas são inadequadas. 

Oferecer alternativas de músicas e atividades mais adequadas. Reforçar os valores que queremos transmitir aos nossos filhos. 

Basicamente, passa por nos fazermos presentes e exemplo daquilo que queremos transmitir aos nossos filhos. 

Agora, o que posso fazer?

“A proteção das crianças deve ser uma prioridade de toda a sociedade” defende a Doutora Beatriz Pereira.

Por isto, como resposta aos múltiplos relatos de situações onde denigrem a integridade das crianças expondo-as a músicas hipersexualizadas, a psicóloga criou esta petição que ainda aberta a assinaturas:

Esta pretende solicitar à Assembleia da República, ao Ministério da Educação e ao Ministério da Cultura que sejam criadas e implementadas diretrizes claras que proíbam o uso de músicas com conteúdos hipersexualizados em contextos e eventos direcionados a crianças. Estas diretrizes devem ser acompanhadas de:

  • Definição de critérios claros sobre o que constitui conteúdo inadequado para crianças.
  • Fiscalização e sensibilização junto de instituições, organizadores de eventos e educadores.
  • Promoção de alternativas culturais e artísticas que respeitem os direitos das crianças e configurem conteúdo educativo.

 

Por isso, se você deseja dar a sua importante contribuição para esta causa em prol dos pequenos, assine esta petição (confirmando a assinatura por e-mail, para ser válida).

Sou mãe de 3, tenho doutoramento em psicologia aplicada, e exerço como psicóloga da criança e do adolescente (recentemente a frequentar uma especialização também em saúde mental perinatal) na Ridomed clínica e também online. @psibeatrizpereira

mulher com o cabelo castanho escuro com cumprimento médio, vestida de amarelo com brincos compridos amarelos, corrente dourada sob o fundo neutro (muro bege texturizado). Ela sorri, contente.

Escrito por

Mariana Ribeiro

Mãe de cinco filhos em ensino doméstico. Apaixonada por filosofia, psicologia e educação. Estuda e escreve sobre família e desenvolvimento humano. @Marianaparaizoribeiro

Artigo escrito por

Mariana Ribeiro

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