Descubra como o parto humanizado pode transformar a experiência de dar à luz. Acompanhe a minha jornada pessoal de dois partos naturais, um humanizado e outro não, e entenda a importância de respeitar a vontade da mãe e criar um ambiente acolhedor. Uma história de empoderamento e mudança pessoal.
Neste post você vai ver
- Parto não humanizado
- Parto humanizado
“Para mudar o mundo, é preciso primeiro mudar a forma de nascer”, foi com essa frase do médico francês Michel Odent que eu iniciei minha preparação para os dois dias mais importantes da minha vida: o nascimento dos meus filhos. E que até hoje eu acredito piamente que o que pode mudar o mundo é como os novos seres chegam nele. E não, eu não tenho intenção de mudar todo o mundo, mas sim o meu mundo.
Antes que eu possa relatar a minha vivencia, é necessário informar que o nome humanizado não pode ser entendido como um tipo de parto, mas sim como o processo que os dois tipos de parto acontecem, ou seja, a cesariana também pode ser humanizada. O que torna as vias de parto humanizada ou não humanizada é o fato de levar em consideração a opinião da mãe e o que ela informou no seu plano de parto, fazendo com que a vontade dela seja respeitada e que ela se sinta acolhida e ouvida.
Eu, particularmente, vivenciei os dois tipos de parto naturais: o não humanizado e o humanizado.
Parto não humanizado
No nascimento do meu caçula, Andrea, eu achava que, após ter passado por um parto natural três anos antes, eu saberia lidar e teria força para impedir qualquer tipo de violência obstétrica, mesmo estando em outro país. Mas não. No nascimento dele eu não era a protagonista, mas sim a midwife, ou enfermeira obstétrica, como se chama no Brasil.
No dia 24 de julho de 2023, por volta das 19h, quando eu estava colocando minha filha para dormir, senti um pouco de líquido quente saindo, ainda cheguei a imaginar que era xixi que eu não estava conseguindo controlar. Depois percebi que era a bolsa que tinha rompido, assim que me acalmei, informei ao meu marido que estava trabalhando no Senegal e à midwife, que pediu para eu aguardar e esperar as contrações começarem e, se não tivessem iniciado, ir à maternidade na manhã do dia seguinte. Assim fiz, cheguei à maternidade por volta das 9h, do dia 25 de julho de 2023, com duas amigas. E, pela primeira vez em minha vida, fiz o exame de toque.
Como eu lembro do meu primeiro trabalho de parto: exame de toque não é necessário ser feito, as alterações podem ser identificadas de outra forma. Como também não é recomendado fazer exame de toque com a bolsa rompida, já que o toque expõe a mulher e o bebê a um maior risco de infecção. Mas permiti que fosse feito em mim ou até não permiti, mas fiquei passiva diante da situação.
Eu estava sem dilatação nenhuma, como também ela não conseguiu perceber a quantidade do líquido amniótico, imaginou que a bolsa tinha sido rompida na parte de cima da barriga. Pela minha experiência, creio que minha bolsa estourou por conta de uma infecção urinária que me acompanhou do meio pro fim da gestação e que não foi levada a sério pelo meu obstetra.
Subi para o quarto do hospital (que curiosamente em uma das minhas visitas ao obstetra eu conheci e mandei uma foto para meu marido mostrando o quanto era legal, com banheira, bola e vários aparatos para um trabalho de parto). E logo a midwife colocou o cardiotocógrafo, mais conhecido como monitor fetal, para monitorar a frequência cardíaca, o movimento de Andrea e as contrações uterinas de forma não invasiva. Neste momento, ela também induziu o parto com ocitocina na veia. Mais uma vez eu sendo passiva diante da situação.
E foi neste momento que meu marido me ligou informando que não conseguiu chegar a tempo no aeroporto para voltar para Malta devido às fortes chuvas em Dakar. Eu não tinha escolha, continuava sendo forte, sentindo a presença de Deus e acreditando que o melhor sempre acontece.
Meu marido estava trabalhando no Senegal e na noite anterior, Dakar, capital do Senegal, estava embaixo de muita chuva o que fez ele perder os dois voos que o trariam para Malta. Em Dakar existem apenas voos noturnos em direção a Europa o que o fez viajar apenas na noite do dia 25 de julho, quando Andrea já tinha nascido.
Lembro de descer para almoçar na maternidade mesmo e, por volta das 11h30 começarem as contrações. Quando voltei para o quarto, às 13h já estava com 6cm de dilatação. E todo o trabalho de parto evoluiu muito rápido. Foi neste momento que minha amiga perguntou se eu queria que colocasse alguma playlist e eu disse que não, disse que não queria chorar. A partir do segundo filho é mais comum um parto mais rápido e fácil, porque os músculos e toda estrutura interna do nosso corpo já foi distendido durante o primeiro parto. O que também me faz pensar que possivelmente eu não precisasse de ocitocina.
Eu não escolhi a forma como queria parir, nem a posição que me dava mais conforto e nem a forma de alívio que eu gostaria de ter. Pari deitada e presa a um aparelho, sentindo bastante dor. E ainda no momento expulsivo, fui violentada, como uma forma de acelerar o nascimento. As posições de cócoras, sentada ou de joelhos são melhores para facilitar a saída do bebê. O canal de parto fica mais curto e a abertura da vagina fica maior, o bebê não aperta a barriga e a circulação de oxigênio para ele é melhor. A midwife também solicitou que eu fizesse força quando Andrea estava prestes a nascer, o que também é considerado um tipo de violência obstétrica. Ainda pediu para eu parar de gritar, mas sempre lembro que o grito ou o choro no parto não são necessariamente de sofrimento. Muitas vezes são uma exteriorização de energia corporal, uma forma de aliviar a tensão e ganhar mais forças.
Quando eu peguei Andrea em meus braços, só conseguia pedir desculpas para ele. Desculpas por não ter dado um nascimento dos sonhos a Andrea, como foi o de Mia, minha primogênita. Mas mesmo assim ainda fui presenteada com um bebê empelicado, que é quando um bebê, ao nascer, ainda está envolvido pelo saco amniótico, que permaneceu intacto. Isso mesmo, aqueles casos que possuem a incidência de ocorrer uma vez a cada 80 mil, e ainda dizem que os bebês que nascem empelicados dão sorte.
Andrea nasceu e só foi retirado de mim para pesar e medir. Depois do nascimento, o meu lado leoa não permitiu que mais ninguém da maternidade tirasse ele de mim. Realmente tivemos uma golden hour. Ele mamou na primeira meia hora de vida dele e não nos desgrudamos mais.
Parto Humanizado
Já a chegada de Mia foi uma chegada dos sonhos. Depois de muita pesquisa, estudo (sim, a maternidade é um momento de muito estudo e busca de informação), comecei a ter muita segurança e a acreditar que eu poderia parir, então decidi parir em casa, porque queria que minha filha nascesse com o coquetel dos “hormônios do amor”, liberados apenas em condições específicas de trabalho de parto e com toda a nossa diversidade de micróbios familiares.
Era sexta, 31 de janeiro de 2020, estávamos de mudança para a nova sede do Explicaê (empresa que eu trabalhava no Brasil) e enquanto eu arrumava as minhas coisas, tímidas lágrimas escorriam pelo meu rosto – no fundo eu já sentia que não voltaria a trabalhar nem tão cedo.
No sábado, eu completei 40 semanas de gestação. Eu e meu marido, que naquela época também trabalhava no Senegal (e tinha chegado uma semana antes) fomos para a casa da minha sogra dormir lá e de noite comecei a sentir muitas contrações, então comecei a cronometrar, mas como eu consegui dormir percebi que ainda não era a hora.
No domingo, apesar da ansiedade (estava doida para que ela nascesse dia 02/02/2020), fomos à praia e vivemos uma vida normal.
Eis que 1h20 da madrugada, da segunda-feira, do dia 3 de fevereiro, fui acordada devido às fortes contrações. Tentei dormir e percebi que as contrações estavam ritmadas e vinham cada vez mais fortes. Acordei meu marido. E assim passamos a madrugada inteira e iniciando a manhã. Sim, tinha chegado a hora. Ela escolheu o dia dela para nascer. Avisamos as enfermeiras do grupo Nascido em Casa (um grupo de enfermeiras obstétricas de parto domiciliar em Aracaju/ Sergipe). Tomei uns quatro banhos e urrava de dor a cada contração que vinha mais e mais forte.
Tentava me concentrar nos exercícios, na respiração, procurar as posições mais confortáveis, mas comecei a entrar na partolândia e seguir apenas os meus instintos sem pensar muito. Luana (veja aqui uma entrevista com Luana) e Hilca, as enfermeiras, iam me indicando o que fazer. Lembro que meu marido colocou a playlist que eu passei quase 9 meses fazendo. E nesse momento lembro que chorei compulsivamente. Cheguei a desistir, a pensar o quão eu era louca em decidir um parto natural, como tudo seria mais fácil com apenas uma cesária. Mas quando decidi meu parto eu falei pra meu marido: “se eu pensar em desistir, me lembre que eu não vou desistir. Que eu escolhi e vou até o fim!”.
Sabe quantos exames de toque eu fiz?! NENHUM! E minha bolsa estourou dentro da piscina, pq ninguém viu o momento. E assim foi. Ela escolheu a hora dela, nascendo 10h50.
Artigo escrito por
Flavia Oliveira
Jornalista e Relações Públicas, formada em Mediadora de Conflitos, pelo Instituto Federal de Brasília, através da Tertúlia Literária Dialógica. Mãe de dois: Mia e Andrea, vivendo em Malta e sempre com uma passagem para o próximo destino a ser descoberto.