O meu filho pode ser vegetariano?

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Criança a cuidar da horta

Hoje em dia vemos muitas modas, que surgem, ficam algum tempo nas memórias e conversas e desaparecem no momento em que surge a próxima.

É importante sermos críticos e sabermos distinguir o que é uma moda de algo cientificamente comprovado e que surge nalgum momento, apenas porque não o tinha sido até então. 

Para mim, o vegetarianismo nunca fez parte dos meus planos e surgiu numa altura em que também era moda, mas foi e continua a ser muito mais. Cresci omnívora, numa família metade ribatejana metade alemã, onde mais tradição de carnes, peixes e até touradas é quase impossível. Um dos meus bisavôs era campino (cuidava dos touros que serviam as touradas) e o meu avô alemão era guarda florestal/caçador. Ao crescer deparei-me com este termo do “vegetarianismo” e dizia na brincadeira que nunca o conseguiria ser. Por outro lado, tenho uma grande tradição de cozinheiros na família. Os meus avós paternos e os seus irmãos, meus tios, foram emigrantes e cozinhavam para famílias bastante abastadas. A comida sempre foi uma paixão comum a todos os membros da família e a desculpa ideal para nos reunirmos e vivermos o melhor que a vida tem para nos oferecer. 

Anos mais tarde, em 2014, quando acabei a faculdade e tinha algum tempo enquanto procurava o meu primeiro emprego, para me entreter, comecei a cozinhar mais, a experimentar pratos e ingredientes novos e a aproveitar uma então grande moda de blogues de comida que surgiam no mercado. Sou uma pessoa da área da saúde e a maneira como o alimento influencia o nosso corpo e espírito fascina-me desde criança. Os blogues que encontrei eram sobre cozinha de base vegetal, o que não me fazia absolutamente confusão nenhuma, porque já em casa cozinhávamos muitas vezes pratos vegetarianos e todos sempre gostámos de todos os legumes e vegetais. Ora experimentava receitas literais, ora juntava alguma proteína animal e ficavam sempre absolutamente deliciosas. Isto foi, creio eu, em Outubro. 

Porém, no início do ano 2015, em Fevereiro, houve uma onda (lá está, outra aparente moda) de documentários sobre a pegada ecológica de uma dieta vegetariana, o impacto que tem tanto no planeta como na nossa saúde e toda a crueldade e horror da indústria alimentar. Nunca imaginei que isto tivesse tanto impacto em mim. Foi mesmo um daqueles poucos momentos na vida em que realmente abrimos os olhos e pensamos “Isto faz tanto sentido!”. Nunca mais olhei para trás, tornei-me vegetariana naquele mês e contagiei parte da família. Foi na verdade, incrivelmente fácil, por já ter tanto conhecimento acerca da culinária de base vegetal e de ter bases de nutrição e saber compor pratos equilibrados. 

Saltando alguns aninhos para a frente, em 2019 conheci o meu atual companheiro e em 2021 fomos pais pela primeira vez e em 2022 pela segunda. O Rafael é vegetariano há mais de 25 anos e nesse aspeto temos valores iguais e preocupações idênticas para com o meio ambiente e os animais. Porém, quando o nosso filho iniciou a introdução alimentar, surgiram as primeiras dúvidas. Já tinham surgido antes, durante a preconceção e gravidez, mas como não tivemos dificuldade em engravidar e não tive nenhuma complicação em ambas as gravidezes (inclusive o ferro sempre em valores aceitáveis) e também por ter conhecimento que uma dieta vegetariana equilibrada supre todas as nossas necessidades, não me preocupei mais.

Quando o Sebastião iniciou a introdução alimentar, procuramos ajuda de uma nutricionista que nos indicou quais os alimentos a privilegiar e oferecer. Tanto a nutricionista, como a nossa pediatra (que é Vegan e acompanha crianças vegetarianas e vegan) deram-nos força e confiança para oferecermos uma dieta vegetariana aos nossos filhos. Enquanto mamaram, houve também sempre aquela segurança de que o leite era o seu principal alimento e fonte de nutrientes.

Para além disso, fizemos uma introdução alimentar guiada pelo bebé (o chamado BLW – Baby Lead Weaning), o que tem inúmeras vantagens, mas que pode também potenciar eventuais dúvidas no pais. Isto porque o bebé pode comer mais de umas coisas do que de outras, normalmente aprende a comer apenas e só a quantidade que o sacia e não come por gula e torna-se autónomo rapidamente, não aceitando ajuda e querendo ser ele a alimentar-se sozinho. A longo prazo, isto é uma vantagem tremenda e é a melhor forma de prevenir a obesidade e problemas associados… mas no momento, não há um dia em que não duvidamos se o nosso filho comeu o suficiente e se tem os nutrientes de que precisa.

Para descansar aqui a nossa mente atribulada de recém-pais, desde cedo que introduzimos alguns multivitamínicos na rotina dos nossos filhos. As primeiras vitaminas que demos foram ferro, ómega 3, vitamina D e vitamina B12. Mais tarde, já quando não mamavam, demos regularmente multivitamínicos mais completos, principalmente no inverno para reforçar o sistema imunitário e também próbióticos.

Hoje, com um filho de 4 e outra a caminho dos 3, estamos muito orgulhosos do nosso caminho. São ambos muito saudáveis, ficando raramente doentes, a crescer bem e com energia para dar e vender. Uma das sensações mais gratificantes deste caminho foi quando o Sebastião foi para a escola e começou a questionar porque é que nós não comíamos peixe e carne como os amiguinhos dele. Nós explicamos e ele compreendeu de uma maneira tão fácil e intuitiva que agora é ele que diz com orgulho que nós somos vegetarianos e já contagia alguns amiguinhos da escola! Quando lhe oferecem alguma coisa que ele receia ter peixe ou fiambre, por exemplo, ele automaticamente rejeita porque leva este compromisso mesmo a sério. É realmente bonito de se ver como valores tão nobres são ainda mais fáceis de transmitir quando somos crianças. Nós adultos é que temos muitos macaquinhos na cabeça e maus e velhos hábitos.

criança a fazer um bolo

Tal como eu e o meu companheiro não crescemos vegetarianos, é natural que em algum momento da vida, os nossos filhos queiram provar ou ter a experiência de comer carne ou peixe. Tal como vão querer experimentar uma bebida alcoólica ou o McDonalds. A vida não é linear, é feita de uma miscelânea de experiências e é isso que a torna tão rica. Aqui o nosso papel enquanto pais foca-se em transmitir e ensinar os nossos filhos a terem os valores corretos (não só em relação a alimentação, mas a tudo), a tomarem decisões conscientes e a terem uma voz ativa em relação aquilo que acreditam.

Por isso, sim, é possível os nossos filhos serem vegetarianos e partilharmos com eles desde cedo aquilo que acreditamos e que nos faz mais sentido. Sigam a vossa intuição e o conselho de profissionais experientes e especialistas na área, para irem com confiança e determinação nos vossos valores e ideias.

Escrito por

Carolina W. Pinheiro

Mãe de 2 e apaixonada pela infância e toda a sua influência na nossa personalidade e trajeto de vida. Em eterna busca daquilo que a preenche e intriga, já trabalhou como farmacêutica, cozinheira e mais recentemente em vias de se tornar ama.

Artigo escrito por

Carol

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